domingo, 30 de junho de 2013

"Pra ser feliz por mentira, melhor que eu chore com fé"



Está se aproximando o lançamento do meu livro "Amamentação e o desdesign da mamadeira", e venho me lembrando das coisas que me motivaram a escrevê-lo.

Uma delas foi essa música do Taiguara, que ouvi muitas vezes, de onde extraí a epígrafe do meu trabalho:

Sorriso bom, só de dentro (...)
Pra ser feliz por mentira, melhor que eu chore com fé.

Os projetos de design costumam ser bonitos, glamourosos, e um monte de adjetivos assim. Mas o desenvolvimento da minha tese não teve glamour algum, pois só me deparava com uma realidade revoltante.

Mas ok, para a publicação eu e uma equipe incrível caprichamos, e posso dizer que o produto que vai para a rua está muito lindo :o)

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Informação parece mais eficaz do que coerção - caso proibição das mamadeiras na Venezuela

Esta nova matéria, do jornal La Nación, publicada em 16 de junho (ontem), trás mais detalhes sobre o projeto que pretende incrementar a Lei de Proteção, Promoção e Apoio ao Aleitamento Materno na Venezuela.

http://www.lanacion.com.ar/1592640-venezuela-busca-prohibir-las-mamadeiras

O artigo diz que aquilo que se pretende é "obrigar as mães a amamentar bebês menores de seis meses", apontando que a coerção - com multa que vai de 654 a 50 mil dólares (imagino que se diferenciem entre famílias e indústrias que insistirem em fazer propaganda de leites artificiais e mamadeiras), não é instrumento aceitável para a mudança de cultura pretendida.

A deputada Odalis Monzón, vice-presidente da Comissão da Família, defende que o objetivo é que se faça cumprir a lei de 2007, por intermédio da proibição da "promoção e publicidade de fórmulas lácteas adaptadas para meninas e meninos, assim como de mamadeiras e chupetas e demais produtos similares, em todos os meios de comunicação e demais meios publicitários com acessibilidade em território nacional".

A Venezuela, assim como o Brasil e inúmeros outros países, é signatária do acordo internacional capitaneado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), de promoção, proteção e apoio ao aleitamento materno, contra as investidas da indústria de fórmulas infantis e mamadeiras, cerceando suas publicidades e propagandas estabelecendo diretrizes globais de médio e longo prazo a serem alcançadas. A IBFAN (International Babyfeeding Action Network) e a WABA (World Alliance for Breastfeeding Action) são as organizações credenciadas para monitorar o controle da comercialização desses produtos e promover ações de âmbito global, como a Semana Mundial de Aleitamento Materno (SMAM), evento anual em todos os países que assinaram o acordo.

Daí a gente pensa: poxa, uma coisa dessa importância toda e não ficamos sabendo de nada?

Essas informações estão disponíveis, e é muito fácil chegar até elas. O problema é que a força da publicidade das indústrias as suplanta. Quem vai procurar se informar mais ou quem vai duvidar de uma empresa que se diz "autoridade máxima em nutrição", como o faz a Nestlé? A tendência é acreditar nisso e nem se preocupar em questionar o que se leu, o que se viu nos anúncios lindos que ela faz, ou ainda questionar a indústria que faz coisas tão gostosas e práticas.

Então, voltando à questão da coerção, da obrigação das mães em amamentarem seus filhos... isso não faz sentido. Isso já aconteceu inclusive no Brasil, na época da medicina higienista, quando o Estado percebeu que precisávamos zelar pela saúde das crianças brasileiras para construir uma nação. Só que não deu certo porque não se obriga uma coisa dessas. O que ocorreu é que muitas mães tinham problemas e os médicos achavam que naqueles casos o leite delas era pouco ou era fraco, inventaram um nome pra isso, hipogalactia, e as indústrias se aproveitaram impetrando seus produtos, num fenômeno que ficou conhecido como "desmame comerciogênico", apoiado pelo estado.

Eu fico aqui pensando -e minha ideia deriva do efeito que minhas palestras provocam nas assistências- que se a Venezuela (e quem dera todos os países) investisse em dar à sua população a informação sobre o problema, retirando os véus que nos cegam (denunciando mesmo as indústrias e seus estratagemas de persuasão, e porque não dizer de coerção em que se consuma seus produtos), as pessoas teriam infinitamente mais chance de mudar sua conduta o que, em somatório, resultaria na mudança de cultura tão urgente.

Porque leites artificiais e mamadeiras são produtos tão nefastos como o tabaco (e muitos outros que se eternizam incólumes), com a diferença de que quem fuma pode até ter começado a fazê-lo sob influência, mas o faz por suas próprias mãos.

domingo, 16 de junho de 2013

Mamadeiras: Rio x Venezuela

É impressionante detectar que a informação que nos chega nunca está pronta, nunca é suficiente, nunca imparcial.

Esta semana, mesmo depois do protesto no Centro do Rio de Janeiro, durante um intervalo comercial na TV Globo, apareceu um "lindo" spot da Prefeitura desta cidade enaltecendo seus feitos no âmbito do transporte coletivo. Acabo de fazer uma busca exaustiva por este vídeo, mas acho que ele há de estar muito bem escondido....

O discurso era o seguinte: a prefeitura está providenciando melhorias para facilitar a vida dos cariocas, trazendo-lhes conforto, agilidade, qualidade e... condições para que sua vida fique cada vez melhor. E para ilustrar essa parte final, aparecia uma cena de uma mãe preparando uma mamadeira, que foi oferecida a um menino de cerca de três ou quatro anos de idade.

1) foi muito louco ver uma propaganda do governo falando maravilhas de um sistema que, justo nesses dias, está servindo de gota d'água para a expressão da insatisfação dos cariocas (e dos brasileiros);

2) o preparo da mamadeira entrou no roteiro como símbolo de qualidade de vida, de afeto, de condições dignas para a população, aquela máxima de "garantir o leite das crianças".

O spot é lindo, muito bem realizado, e quem o assiste tem motivos de sobra pra acreditar no que vê: que o Rio está progredindo a passos largos no campo do transporte público de qualidade e que uma mamadeira dada a uma criança é sinal de que ela está sendo bem atendida por seus pais, agora com mais chance de lhe dedicar a atenção devida.

Só que estas duas afirmações são falaciosas. E quem o diz são os cariocas que penam pra se deslocar na cidade e a Organização Mundial da Saúde que luta há quase 40 anos pra diminuir a morbidade e mortalidade infantis provocadas pelos leites artificiais em mamadeiras, que matam cerca de um milhão e trezentas mil crianças anualmente em todo o mundo.

Mas agora, façamos um corte neste relato para analisar um outro fato.

Na Venezuela, uma deputada chavista quer proibir o uso de mamadeiras no país, com vistas a incentivar o aleitamento materno. http://noticias.terra.com.br/mundo/america-latina/deputada-da-venezuela-quer-proibir-uso-de-mamadeira-para-bebes,e7ee2aa7dc04f310VgnCLD2000000dc6eb0aRCRD.html

Odalis Mozón defende que a iniciativa faz parte de uma reforma da Lei de Proteção, Promoção e Apoio à Amamentação, que propõe a proibição de todos os tipos de mamadeira, exceto para filhos de mães doentes (HIV, por exemplo) e crianças órfãs.

O assunto está irritando os críticos do governo, que alega excesso de intromissão do Estado venezuelano na vida privada dos cidadãos. Alega-se que cada um deve ser livre para determinar a forma com que deseja alimentar seus filhos, enquanto o projeto alega que as multinacionais estão afastando as famílias com suas ofertas que afastam as pessoas da prática da amamentação.

Mais uma vez a gente se depara com uma informação que exige crítica e aprofundamento para ser compreendida. A tradição chavista, ao menos aos nossos olhos estrangeiros, tende a ser entendida como supressão de liberdades. E, também aos nossos olhos, a mamadeira e os leites artificiais são um símbolo de liberdade e de modernidade.

Mentira.

A deputada está defendendo uma conduta compatível com o consenso científico alcançado na seara da segurança alimentar infantil. Claro que o ideal seria que esse consenso se tornasse público de maneira não impositiva. Mas quem faz os lindos filmes nos quais acreditamos são as indústrias de leite artificial, e neles acreditamos, como se fossem os bastiões da nossa tão prezada liberdade.

sábado, 8 de junho de 2013

Os humanos também têm direito

https://www.youtube.com/watch?v=XwFKEpckFoM&feature=player_embedded

Lindo filme realizado pela Unicef chinesa!

Finlãndia: um exemplo!


Neste 4 de junho, a BBC News Magazine publicou um artigo contando que, na Finlândia, há 75 anos, o Estado presenteia as famílias que terão bebês com uma caixa de papelão recheada de presentes. A caixa vem com um colchãozinho ao fundo e poderá servir de berço para as crianças (muitas famílias não têm condições financeiras para compra-lo) nos primeiros tempos.


E ela vem recheada com o enxoval da criança. Acreditem e vejam:


Há de tudo, inclusive um super-macacão bem quentinho, já que o país é muito frio.

Encantador, maravilhoso, sensacional ... e muito mais do que isso, pois esta tradição finlandesa responde às mudanças de paradigma, orientando carinhosamente a população a acatar tanto as descobertas da ciência e da medicina e também da indústria, quanto a renegar as inovações propostas por esta última a cada vez que isso se mostrar necessário.

Desde 1949, as caixas são enviadas apenas às mães que realizam o exame pré-natal. Como todas devem querer recebe-la, resolve-se assim a questão do acompanhamento de sua gestação;

Desde 1957, ao invés de enviar tecidos e linhas para a confecção do enxoval, a caixa vem com roupas prontas;

Em 1969, as fraldas descartáveis foram introduzidas mas ...

Desde 2006 (antes tarde do que nunca), essas fraldas foram retiradas para a reintrodução das fraldas de pano, já que elas não são respeitosas ao meio ambiente;

E desde 2006, também, mamadeiras e chupetas foram retiradas do pacote com a finalidade de incentivar o aleitamento materno.

:o)

Isso é de uma inteligência, de uma perspicácia, de um carinho e cuidado impressionantes....

Uma caixa que evolui em termos científicos, comportamentais e estéticos. Isso é um programa político. É essa a política que sempre me interessou e na qual sempre acreditei. Que alegria constatar respeito, delicadeza e compromisso em uma ação estatal, convertida em um presente, um auxílio às famílias.

Quando vejo coisas assim, penso: é possível.

Me revolto com a realidade que conhecemos, tão sem esperança, mas sou incentivada a seguir.

Sempre.

Muito obrigada, Gabriela Romero, por me enviar o artigo. Estamos em rede.

sábado, 1 de junho de 2013

Mothers and sisters and brothers, and ...



Às vezes consigo me ATIRAR no sofá e assistir ao seriado "Brothers and Sisters". Eu nem sou muito fã não, mas é muito interessante ver a rotina complexa de uma família, toda editada, sem as longas horas e os incontáveis procedimentos pelos quais temos que passar todos os dias: só aparecem as cenas que interessam. E da última vez, cheguei a uma singela conclusão, a de que uma das maiores diferenças entre o que é exibido e o que acontece na vida das pessoas é a de que, no seriado, tá todo mundo sempre arrumadinho e maquiado, e na vida real a gente tá quase sempre sem esses aparatos, muitas vezes totalmente desgrenhados :o).

Estou com 54 anos, e as pessoas próximas à minha idade tendem a viver os mais altos níveis de stress e de responsabilidade, porque além de pais de filhos adultos que iniciam sua vida, são responsáveis por seus pais. Ou seja, esse papo de que avós são pais duas vezes é fichinha perto do fato de que adultos da minha idade são ... , como dizer ..., ahn.... estão é numa grande enrascada, já que precisam se triplicar pra dar conta dos filhos, dos pais e de si mesmos.

Olha, não é mole não.

Mas voltando a falar do seriado, me toco também que a vida da gente pode ser um carrossel, ao invés de apenas uma louca montanha russa. E nos últimos dias eu comprovo que não tenho que reclamar de pasmaceira na minha vida. E vou explicar porque:

1) Dei um mal jeito na coluna que me tirou do sério
2) Mas o tempo melhorou e pude fazer com minha mãe um passeio lindo à Praia Vermelha
3) Participei do Congresso Virtual de Aleitamento Materno, uma iniciativa maravilhosa do Dr. Marcus Renato. Me enrolei tanto, aqui sozinha, pra entender o funcionamento da tela! Mas acabou correndo tudo bem, e pude assistir a palestras excelentes dessa gente toda que trabalha em prol da segurança alimentar das crianças
4) À tarde, tive reunião com minha equipe do projeto do copinho, pude lhes contar dos avanços que estamos fazendo junto ao Instituto Fernandes Figueira, e ainda reencontrei Catarina, a filhinha de Fernando, que estava dodói - motivo da reunião acontecer em sua casa
5) Chegando em casa, feliz da vida e cansada, minha irmã me contou ao telefone que nossa mãe estava com uma infecção que necessitaria de internação para tratamento. Mas ela acabou de levar alta do hospital!
6) Uma breve "reunião" com ela, seu clínico, meu marido e um amigo também médico (que nos visitava de surpresa), e a conclusão: amanhã a levaremos para a emergência
7) As sete horas que ficamos lá foram suficientes pra conseguirmos que o tratamento fosse feito sem internação, contanto que a levássemos lá todos os dias para receber medicamento
8) À noite, exaustos, fomos a um bar de tapas e tive que meio que rodar uma baiana porque nosso pedido não chegava nunca e eu estava bebendo de estômago vazio
9) E lá se foi a semana, com milhares de acontecimentos, sobressaltos, alegrias (o filme que minha filha fez, cujo nome é inspirado na sua música predileta quando bebê, foi selecionado para um festival em Tel-Aviv!), minha mãe está bem - só que ainda não foi verificado se a infecção foi debelada, e....
10) Estou aqui, num sábado tranquilo (até segunda ordem), escrevendo este post e pensando: será que consigo assistir ao episódio de hoje de "Brothers and Sisters?" Sim, eu gosto de ver e me relaxa. Porque os problemas não são meus.