segunda-feira, 21 de abril de 2014

Aula final - curso "O consumo infantil"

Finalizo minhas notas sobre o curso "O consumo infantil" comentando brevemente a aula ministrada pelo jornalista André Trigueiro.

Recém chegado de uma viagem de trabalho à China, ele expressou o quanto estava impactado com o que viu por lá, uma sociedade que convive rotineiramente com índices de poluição atmosférica muito, mas muito além do que seria concebível; uma juventude que, ao tentar migrar para outros países, alega perseguir com isso o direito a condições básicas, como ter acesso a ar pra respirar. Com essa introdução, André trouxe para a turma o resultado de sua busca em dicionários para a palavra CONSUMIR: destruir, dilapidar, causar ou sofrer dano, esclarecendo que o consumismo - fenômeno contemporâneo- é o consumo em excesso, um desperdício.

Ao citar Ladislau Dalbor, economista da PUC de São Paulo, trouxe para a turma a frase que considero ser a tradução exata da tal da alucinação (citada no post anterior) pela qual acho que estamos cada vez mais enredados, na avidez de comprar, de ter, de progredir, crescer:

"Crescer por crescer é a filosofia da célula cancerosa"

Eis o "dilema" contemporâneo: modelo de expansão econômica x modelo de equilíbrio econômico....

Nada melhor do que a leitura do artigo de Victor Margolin, "O design e a situação mundial", para poder refletir sobre isso:
http://www.esdi.uerj.br/arcos/arcos-01/01-03.artigo_victor(40a49).pdf



Foi muito bacana fazer esse curso, conhecer essas pessoas, partilhar com a turma tantas indagações e experiências.

A situação é pra lá de preocupante, e disso a gente já sabia. Mas é importante que isso seja falado, discutido, alertado. Quem sabe possamos contribuir na procura de uma saída.

sábado, 19 de abril de 2014

Sobre o curso "O consumismo infantil" - aula 2

Laís Fontenelle ministrou a segunda aula do curso. Ela é do Instituto Alana, de São Paulo, que dentre muitas outras funções importantes em defesa das crianças produziu o documentário "Muito além do peso" - uma denúncia sobre o quanto a infância brasileira vem sendo cooptada pela indústria de alimentos nada saudáveis. Pra quem ainda não viu, super vale à pena assistir!



A aula foi muito rica de informações, mas novamente aqui vou me restringir a compartilhar algumas notas que fiz e tecer comentários sobre o que mais me chamou a atenção.

Laís começou contextualizando o papel da criança na história, lembrando que apenas muito recentemente (séc XVII/XVII) a noção de infância surgiu, pois antes disso as crianças eram consideradas adultos pequenos, já que improdutivos, desconsiderados até mesmo nas representações pictóricas. Sugerindo a leitura do livro "O desaparecimento da infância", de Neil Postman, citou um trecho em que o autor sublinha a importância do surgimento da prensa tipográfica na configuração da noção de infância, pois aprender a ler foi desde então se tornando um divisor de águas no reconhecimento da criança enquanto sujeito da sociedade.

Hoje, diante de todos os aparatos de informação e de comunicação, antes e mais do que aprender a ler, o conhecimento é transmitido por imagens (na TV, nos Ipads, Iphones etc., mídias detentoras de eloquente papel pedagógico nessa nossa cultura), e alarmantemente o que define a criança como sujeito social é o fato de que ela pode consumir.

Pesado isso, não é? Mas real....

Um mercado imenso de produtos mercantiliza a infância; o ritmo alucinante da vida dos pais se torna permissivo à terceirização dessa mesma infância, delegando a produtos e serviços os cuidados com os pequenos.

Laís mostrou alguns anúncios voltados para as crianças realmente infames e falou da luta do Instituto Alana no sentido de proibir publicidade voltada a esse público, poucos dias depois da primeira vitória alcançada no Brasil: http://defesa.alana.org.br/post/82994668848/entenda-a-resolucao-que-define-a-abusividade-da

E daí veio, pra mim, a bomba da noite: a notícia de que hoje existe uma área do marketing com foco também para os pequenos, o merchantainment - a fusão entre propaganda e entretenimento. Segundo o blog Consumismo e infância:

"O merchantainment está em todos os lugares. A Disney World, por exemplo, realiza para seus funcionários cursos sobre o tema, com o objetivo de formar “merchantainers” que criem uma experiência positiva aos visitantes do parque no intuito de que eles comprem mais produtos. No entanto, é quando a prática chega ao mundo digital que ela ganha mais força, com a geração de conteúdo lúdico móvel, sites e redes sociais com objetivos mercadológicos. A Ralph Lauren Kids, por exemplo, começou nos Estados Unidos uma nova campanha chamada RL Gang, que consta de um livro e um filme na internet onde os personagens usam roupas da marca que estão à venda nas lojas. Ao assistir o vídeo, crianças podem clicar nos seus personagens preferidos para comprar seus guarda-roupas. Esse tipo de ação publicitária faz com que a criança crie uma associação entre o produto e a diversão, se aproveitando da vulnerabilidade da criança, que não percebe o intuito de venda."- See more at: http://www.consumismoeinfancia.com/16/12/2010/fusao-entre-publicidade-e-entretenimento/#sthash.eYTmtShi.XPHJt8P6.dpuf

Dos comentários que se seguiram à fala de Laís, fiquei com a exata noção de que o consumismo é uma droga, uma droga lícita, cujos efeitos são alucinógenos, criam uma dependência cada vez mais sem saída do consumo, uma vez que é difícil visualizar qualquer remédio pra isso.

Então me lembrei desse trecho do meu livro, sobre quando o marketing estava surgindo.


Em 1957, quando as relações entre indústria, comércio e consumidores pareciam viver uma fase tranquila, Vance Packard publicou uma estridente denúncia dos recursos de manipulação adotados por agências de publicidade e escritórios de marketing, intitulado The Hidden Persuarders: Em 1957, quando as relações entre indústria, comércio e consumidores pareciam viver uma fase tranquila, Vance Packard publicou uma estridente denúncia acerca dos recursos de manipulação adotados por agências de publicidade e escritórios de marketing, intitulado The hidden persuarders:
Estão sendo feitos, com êxito impressionante, esforços em ampla escala para canalizar nossos hábitos irrefletidos, nossas decisões de compra e nossos processos de pensamento, com o emprego de conhecimentos buscados na psiquiatria e nas ciências sociais. […] Parte da manipulação que está sendo tentada é simplesmente divertida. Outra parte é inquietadora, principalmente quando encarada como um prenúncio do que talvez esteja reservado a todos nós, no futuro, em escala mais intensa e efetiva. (Packard, 1959, p. 1)
O autor alertava que tais pesquisas se dedicavam a convencer o público tanto acerca da aquisição de mercadorias quanto da adesão a ideologias e atitudes. Preocupado com a questão moral, sinalizava que o princípio da manipulação abre espaço a questionamentos perturbadores, como o que indaga que tipo de sociedade ela é capaz de moldar, haja vista seu poder de penetração pelos meios de comunicação de massa:
Talvez os adeptos da geração de otimismo tanto nos negócios como no governo possam apresentar argumentos impressionantes sobre a necessidade de preservar a confiança pública para que tenhamos paz e prosperidade. Mas para onde isso nos está conduzindo? (p. 239)
Tentando considerar a possibilidade de haver espírito de pesquisa sobre o comportamento humano na atitude dos cientistas sociais e psiquiatras que cooperam com os métodos de persuasão comercial, Packard reivindicou a elaboração de códigos de ética profissional; e embora não tenha incluído os designers dentre os responsáveis pelo fenômeno (o que Ralph Nader e Victor Papanek fariam em breve), profetizou:
Além da questão das práticas específicas dos persuasores e dos cientistas a eles associados, há a questão maior de saber para onde nossa economia nos está levando sob as pressões do consumismo. Essa também é uma questão moral. De fato, suspeito que está destinada a ser uma das grandes questões morais de nosso tempo. (Packard, 1959, p. 243)
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Sem dúvida alguma, caro Vance. 

sexta-feira, 18 de abril de 2014

Notas (um pouco aleatórias) sobre o curso "O consumismo infantil - danos no presente, ameaça para o futuro" - aula 1

Ministrado pelo pediatra Daniel Becker, por Laís Fontenelle - do Instituto Alana, e por André Trigueiro, jornalista, este curso ocorrido na Casa do Saber deixou - na minha opinião- uma marca bastante original: a perspectiva macro sobre o assunto. Num momento em que tudo tende ao foco, em que parece se estar dependente de recortes para ir fundo nas questões, sermos brindados com uma lente grande angular é um luxo, principalmente porque dela depende o real entendimento de muitos problemas.

Eu me lembro da fala do Prof. José Maria Gomes em minha defesa de tese: "Por mais incrível que possa parecer, a mamadeira é efetivamente uma questão das Relações Internacionais". É sim, e de todas as áreas do conhecimento também. Considera-la como objeto de estudo restrito à área da saúde é não vê-la e não entende-la devidamente. A perspectiva macro pode ser arriscada (ah, vai se perder...) mas sem ela se corre o risco de não reunir elementos suficientes para uma análise crítica.

Vou fazer três posts, um sobre cada aula, pois a carga de informação foi muito grande e assim acredito que me organizarei melhor.

O Dr. Daniel iniciou citando que a descoberta dos micróbios e bactérias (que estão fora do nosso corpo e são invisíveis) e a criação da penicilina (vacinas e antibióticos) propiciaram que males externos ao organismo humano pudessem ser tratados. Mas essa lógica da medicalização persiste até hoje, mesmo depois de nosso estilo de vida ter mudado ao ponto de os males dos quais sofremos não serem mais externos, mas sim muitas vezes internos, resultantes do estilo de vida que assumimos. Por exemplo, as doenças cardíacas são provocadas por hábitos alimentares, falta de exercícios físicos, tabagismo. Mas a lógica prossegue sendo a de medicalizar esse mal ao invés de mudar esses hábitos, nos colocando como sujeito da frase "eu não participo da minha própria cura".

As indústrias farmacêutica, estética etc. tomam o lugar do novo Messias, e a salvação se realizará pelo consumo de seus produtos, motivo para os fenômenos contemporâneos da medicalização da vida, da mercantilização e estetização da saúde.

Daí ele falou do sol, da importância do sol para a vida de todos, do quanto a chegada do filtro solar nos afastou do convívio com seu calor, com as benesses que ele nos dá. Todo mundo com medo do sol, se preservando do câncer de pele. Sim, há que se preservar a pele da exposição abusiva, nos horários em que ele não é legal, mas muitas pessoas fogem do sol, eliminaram a exposição ao sol de suas vidas. Nossa, daí ele falou uma coisa que me abalou muito: tomar suplementos de vitamina D não resolve porque o que o sol nos dá é muito mais do que isso. E se a uma mulher faltam as vitaminas proporcionadas pelo sol, quando ela engravidar, não as terá para transmitir ao seu filho (!!!!).

Muitas coisas importantes foram ditas naquela noite. Registro aqui aquilo que foi mais impactante pra mim.

E, de tudo, o que mais me estremeceu foi ouvir em uma frase aquilo que percebo dia após dia, e que resume a urgência de mudança de postura de todos nós perante a vida: as elites financeiras, diante da crise ambiental e de quaisquer crises, farão de tudo para manter seu status quo, utilizando como estratégia o princípio de negação de todo e qualquer problema.

Naquele momento baixaram na minha cabeça a lembrança dessas imagens de uma campanha da marca Diesel, de alguns anos atrás. Eu me arrepio só de pensar, porque o fato é que coisas análogas a essas já cansam de acontecer.







domingo, 13 de abril de 2014

Somos todas Adelir

Tantas coisas acontecendo e eu sem poder comentá-las aqui... Cabeça a mil, solicitações de muitos outros lados.

Nosso assunto são os filhos, os bebês e sua segurança, mas a vida é composta de tantas coisas que às vezes fica impraticável o foco em nossos maiores interesses.

Um dia, depois que a gente cresce - e até envelhece - os bebês têm que cuidar de suas mães. Eu cresci, envelheci, e estou tentando cuidar da minha. E como hoje nós duas fazemos aniversário de estarmos juntas nesse mundo, dedico a ela esse post.

Há 55 anos atrás, minha mãe relatou a mim ter sido acometida de um forte sentimento de solidão ao me dar à luz. Por não me ter mais dentro de si? Por se ver diante de uma nova realidade?

Só solidão mesmo, em suas múltiplas facetas. Essa coisa que marca a vida de cada um, da qual não adianta fugir, para a qual todo e qualquer remédio não aplaca, só alivia.

A palavra solidão tem um peso... mas hoje considero esse peso um tanto injusto. Ela não é fácil de se sentir, mas é reveladora, pois nos apresenta a pessoa com quem mais nos relacionaremos na vida, com quem poderemos sempre contar, aquela a quem estaremos ligados estruturalmente.

E é uma das coisas mais incríveis da vida a gente se sentir bem acompanhado por nós mesmos, cruas figuras, sem qualquer nota para a aparência; reais características, sem qualquer disfarce.

Então, além de dirigir esse pequeno post à minha mãe - a quem tenho dedicado minha maior atenção e meu maior zelo nesses últimos dias, o dedico também a todas as mulheres que, com a maternidade, seus sonhos e sua às vezes dura realidade, precisam fazer uma aliança consigo mesmas, a maior garantia de auto-respeito, de preservação de direitos, para seus filhos e para a sociedade.

Meu corpo, meu peito, minhas regras
Somos todas Adelir.

http://fotografia.folha.uol.com.br/galerias/24414-ato-contra-parto-forcado#foto-383146

E vejam entrevista com Adelir: http://www.cientistaqueviroumae.com.br/2014/04/uma-conversa-com-adelir-e-emerson-eu.html