domingo, 2 de janeiro de 2011

Sobre o leite humano

É preciso compreender o processo da lactação e transitar também por dados bioquímicos para entender o que motiva a luta pelo controle da comercialização de fórmulas infantis e de apoio ao resgate da prática da amamentação[1].


98% do leite são produzidos na hora, a partir da sucção. A ocitocina é o hormônio responsável pela contração das células que envolvem os alvéolos no seio e é também “disponibilizada em resposta a estímulos condicionados, tais como visão, cheiro e choro da criança e a fatores de ordem emocional, como motivação, autoconfiança e tranquilidade”. Vale dizer que, ao contrário do que se imagina, a “descida do leite” pode acontecer até o terceiro ou quarto dia após o parto, ou seja, o fato de o leite não verter imediatamente não é sinal de anormalidade.

A continuidade da lactação é viabilizada pela sucção e pelo esvaziamento das mamas. Quando elas não são esvaziadas, pode haver inibição mecânica e química de novas quantidades de leite.

Assim que a criança nasce, a secreção de leite é menor que 100 ml por dia. No quarto dia essa vazão tende a aumentar para 600 ml.

Na amamentação, o volume de leite produzido varia, dependendo do quanto a criança mama e da frequência com que mama. Quanto mais volume de leite e mais vezes a criança mamar, maior será a produção de leite. Uma nutriz que amamenta exclusivamente produz, em média, 800 ml por dia no sexto mês. Em geral, uma nutriz é capaz de produzir mais leite do que a quantidade necessária para o seu bebê.

“O leite humano é muito mais do que uma fonte de nutrientes, é uma substância viva de grande complexidade biológica” (Almeida citado por Novak em curso no IFF, conforme nota 1), constituído por 250 elementos químicos adequados à espécie: energia, proteína, caseína, lipídeos, carboidratos, vitaminas A, D, E, K, C e B 12, tiamina, riboflavina, niacina, piridoxina, folato, cálcio, fósforo, ferro, zinco, água, sódio, cloro e potássio. Para produzir um mililitro de leite, cinco litros de sangue da mãe são escalados.
Tais elementos se organizam em uma emulsão composta por 87% de água e 23% de gordura uniformemente distribuída numa suspensão verdadeira, graças a uma membrana fosfolipoproteica que envolve a gordura, permitindo que ela se misture homogeneamente aos demais elementos. Essa “gordura empacotada” já vem com a enzima necessária à sua dissolução no trato gastrointestinal do bebê. Devido à grande percentagem de água no leite materno, não é necessário administrar quaisquer líquidos complementares à dieta da criança amamentada durante os quatro a seis meses de vida, como reza a orientação da Organização Mundial da Saúde.

Presentes nessa solução estão anticorpos, carboidratos, minerais e vitaminas. No leite humano, os anticorpos são humanos, compondo 30% de caseína (proteína provedora de aminoácidos livres, cálcio e fósforo) e 70% de proteína do soro (lactofeína e imunoglobinas). Essa proporção é diferente no leite de vaca (60% de caseína e 40% de proteína do soro), onde os anticorpos não são humanos. A maior quantidade de proteína no leite de vaca influencia positivamente o aumento de peso da criança que o ingere. Porém, os rins dos bebês não são preparados para receber tal cota extra.

Pode-se dizer que, ao ser amamentado, o bebê recebe como que uma “entrada”, um “prato principal” e uma “sobremesa”. Ou seja, o leite humano do início da mamada é menos gordo, trazendo os fatores de proteção; logo vem a suspensão com proteínas, e, ao final, a emulsão com a gordura — onde está o beta-caroteno (vitamina A) que hidrata o bico do seio, evitando fissuras. Após seis meses de aleitamento, o leite vai ficando mais salgado, preparando o bebê para a alimentação que virá, o chamado desmame bioquímico.
Quando congelado, o leite materno pode durar até 15 dias; se pasteurizado, o prazo se estende para seis meses. A pasteurização visa impedir o desenvolvimento de bactérias, grave problema de qualquer tipo de leite.

Quando nascemos, somos extremamente vulneráveis a infecções. Temos muitos “inimigos” querendo penetrar no nosso organismo e somente um “aliado”: o leite humano. Nos seres humanos, as taxas de anticorpos presentes no sangue são muito altas, e grande parte deles pode ser transmitida pelo leite materno: ao mamar, a criança recebe a experiência imunológica acumulada durante toda a vida de sua mãe. Daí a recomendação da OMS para que o aleitamento comece na primeira hora de vida da criança, visando imunizá-la. Também destoando do saber leigo, não há alimento melhor para prematuros do que o leite materno.





[1] Grande parte das informações deste capítulo foram obtidas na aula do pesquisador Franz Novak, no curso “Amamentação: a relação entre o biológico e o social”. Instituto Fernandes Figueira – IFF, Dezembro de 2008.
[2] Saúde da Criança: nutrição infantil. Cadernos de Atenção Básica. Editora Ministério da Saúde, Brasília-DF, 2009.

2 comentários:

  1. Cristine,
    Gostei muito do seu blog e quero te convidar para participar do Grupo Virtual de Amamentação no orkut-

    http://www.orkut.com/Main#Community?cmm=52101

    Cujos princípios são semelhantes ao material que você posta no blog. Seria excelente se você postasse seus artigos lá!!

    Grata desde já,
    Andréia Mortensen

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  2. Andréia,
    Fico muito feliz com seu comentário e motivada a aceitar seu convite. O fato é que tenho pouca intimidade com essas ferramentas ... mas vou consultar as minhas bases (filha, amigos) e assim que tiver alguma notícia farei contato.
    Beijos
    Cristine

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