domingo, 13 de dezembro de 2020

Leite de peito e leite de lata


Os índices de amamentação cresceram no Brasil, mas a indústria de fórmulas lácteas prossegue sofisticando suas estratégias para poder continuar lucrando. Duas recentes matérias nos trazem informações importantes. 

A primeira delas, publicada pela Radis (Fiocruz) em 4 de dezembro, divulga os resultados do Estudo Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil, empreendido pela Fundação, UFRJ, UERJ e UFF, em parceria com universidades e instituições públicas de todo o país. O estudo surge 14 anos depois do último levantamento realizado sobre o assunto e demonstra que o aleitamento materno exclusivo para bebês menores de seis meses subiu de 37,1%  para 45,7%. Outro indicador, esse bem mais expressivo, aponta que o aleitamento materno exclusivo até os quatro meses subiu de 4,7% em 1986 para 60% em 2019.

Tais resultados se devem a muitos fatores, dentre eles o programa de extensão da licença maternidade de quatro para seis meses, a expansão daos Bancos de Leite Humano, a certificação de Hospitais Amigos da Criança, os efeitos da atenção primária em saúde e a institucionalização da Norma Brasileira de Comercialização de Alimentos para Lactentes, Crianças de Primeira Infância, Bicos, Chupetas e Mamadeiras (NBCAL). Pode-se acrescentar aqui o permanente e apaixonado trabalho da sociedade civil: os grupos de mães, o trabalho das doulas, dos obstetras, enfermeiros e pediatras comprometidos em proporcionar um início auspicioso para as crianças e suas famílias, e tantas outras iniciativas que eu nem saberia enumerar.

Imagino que um levantamento desses seja de realização bem mais complexa do que as de pesquisas de opinião para eleições, ou as de nível de popularidade de governantes, mas um hiato de 14 anos para verificar um quadro de tamanha importância é demais! Eu me lembro do alívio e alegria que os integrantes do grande comitê organizador (do qual eu fazia parte) do Encontro Nacional de Amamentação (ENAM 2019) -que agregou também a convenção mundial sobre o tema- expressaram ao saber que o Estudo havia sido autorizado. Tudo nesse campo parece ser resultado de muita luta.

Depois de quatro dias, foi publicada no site O Joio e o Trigo a matéria Pesquisa do Joio com mães confirma pressão para substituir leite materno e muita influência da indústria. Daí eu penso em como a luta é difícil ..., e continuará a ser ... e no quanto são valiosas as notícias divulgadas no Estudo do primeiro artigo que citei aqui. Pra dizer a verdade, eu sei -a cada dia, de cada vez mais mães que amamentam. Os jovens estão, sem dúvida, cada vez mais bem informados. É importante que estejam, porque a indústria é poderosa e não age sozinha, como atesta a matéria:

"Na pesquisa do Joio, realizada entre 14 e 21 de outubro, mais da metade das mulheres relatou ter sido desestimulada a amamentar por um profissional de saúde. Quase 75% recebeu a recomendação médica de usar a fórmula infantil e 42% declarou ter usado o produto antes da criança completar seis meses de idade, período em que o ideal é a amamentação exclusiva. Nestlé e Danone estão na dianteira das marcas mais utilizadas".

Então a gente percebe o sentido da palavra LUTA, porque mesmo decididas a amamentar, as mulheres são desestimuladas a fazê-lo, e por ninguém menos do que aqueles profissionais que teriam que compreender sua vulnerabilidade e incentivá-las a realizar o que tão bem haviam planejado fazer.

Eu sou designer e sempre me encantou o potencial da indústria e seus processos. Mas isso, gente, é crime.; a ganância pelo lucro auxiliada pelo marketing é inominável. Porque como diz o cartaz da WABA (World Alliance for Breastfeeding Action) de 2007 para a Semana Mundial de Aleitamento Materno que ilustra esse post, bebês morrem.





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