domingo, 11 de maio de 2014

O Dia das Mães, sob o pretexto do filme "O renascimento do parto", por mãe e filha

O maridão barbudo, meus dois enteados e a primeira mamada de nossa filha.

Quando a gente começa a estudar um assunto, deparamos com sua vastidão...

Investigar as mamadeiras tem me levado a "mares nunca d'antes navegados", por alguns dos quais eu já naveguei sem ter a devida consciência disso...

Muito depois do que seria esperado de uma pessoa que, como eu, estuda o lance, comprei "O renascimento do parto", filme de Érica de Paula e Eduardo Chauvet, e o assisti junto à minha filha. Depois de fazer um comentário sobre a situação que antecedeu o meu encontro com ela, Adélia Jeveaux, vou tecer aqui meus comentários sobre o filme e compartilharei também os comentários dela, num post que comemora o fato de que os filhos crescem e de que amadurecemos, sem dúvida nenhuma, ao seguir vivendo.

Muito bem, muito tem se falado sobre violência obstétrica e o filme trata também disso com muita propriedade. Então vou dividir com vocês um pedacinho da minha história de parto.

Meu obstetra, muito querido desde a adolescência, lá pelas tantas do meu pré-natal, afirmou que um exame havia acusado o fato de que eu teria Herpes Genital. Isso seria um impedimento para um parto normal porque era muito difícil garantir que, na ocasião do parto, a doença estivesse inativa. E, em caso de atividade, ela colocaria meu bebê sob o risco de hidrocefalia, sei lá... NA HORA eu concordei que o mais adequado seria fazer uma cesariana, claro! Como é que eu colocaria em risco a vida do meu bebê?

Bom, eu costumo dizer que meu parto, mesmo tendo sido cesariano, foi lindo. Meu marido, por ser médico, estava do lado; tudo transcorreu conforme o esperado; vi minha filha por alguns minutos e fiquei muito feliz. Depois, fiquei três horas agoniada esperando por ela no quarto. A sorte foi que ela mamou no meu peito sem problemas. Os pontos do corte custaram a cicatrizar, eu andava toda encurvada ... Mas isso passou.

Muito bem, depois de tantos anos, 25 pra ser mais exata, ao assistir o filme me dei conta do seguinte:

1) Eu nunca havia tido herpes genital;
2) Eu nunca vi esse tal exame que dizia que eu tinha herpes genital
3) Eu nunca voltei a ter herpes genital.

Ou seja, só agora eu percebi que posso ter sido redondamente enganada pelo meu obstetra. Pra que o parto fosse do jeito melhor pra ele. Tudo bem que, depois, por uma questão de grana, tive que mudar de equipe, mas o fato é que o "pacote cesariano" foi muito bem preparado e chegou prontinho pro outro médico.

O que percebi vendo o filme? Acaso minha impressão sobre meu parto mudou, deixando de ser "lindo"?

Percebi uma coisa importantíssima e grave: meu parto não foi pleno.

Ele poderia ter sido muito mais lindo, muito mais especial, muito mais meu e de Adélia.
Tive roubada a plenitude do meu parto.

E o que é plenitude? De que importa a plenitude, se tudo "acabou bem"?

Importa porque ninguém tem o direito de, por ameaças terroristas, diminuir a experiência de outrem.
Importa porque estamos vivendo num mundo em que isso vem sendo colocado em prática sistematicamente, em várias searas de nossas vidas.
Importa porque a vida é muito mais do que, muitas vezes, nos permitem que ela seja.
E, por fim, importa porque falar disso é imperioso pra que as mulheres se tornem aos poucos novamente donas de seus mais delicados e poderosos momentos, conforme a natureza as dotou.

Super-recomendo o filme.
Super-recomendo informação.
Super-recomendo a leitura das impressões que se seguem daquele bebê que saiu do meu corpo, Adélia, porque, saibam, eles crescem, e podem agir.

Agora, o texto de Adélia:


Acabei de assistir ao documentário "O Renascimento do Parto". Desde criança minha mãe comentava comigo, diante da minha curiosidade e de outras circunstâncias pertinentes, como parto normal era melhor pra mulher, apesar de eu ter nascido de cesár...ea. Lembro de me assustar com a ideia do corte, a ideia de ficar dias no hospital e a ideia de ficar horas separada do bebê, desde muito pequena.
Eu sonho que estou grávida/parindo/tenho um bebê pequeno na base de umas três vezes por semana. Tenho plena consciência da minha necessidade pela gravidez, parto e maternidade, e de uma forma bem mais animal do que existencial. Lembro de quando me disseram que eu tinha "anca boa", que seria "boa parideira", não soou nem um pouco mal aos meus ouvidos.
Eu (eu) acho que o dia mais importante da minha vida vai ser quando eu der à luz meu (primeiro) filho, e portanto acho que vale mais à pena gastar uma fortuna, se possível, pra garantir que esse dia corra como eu sempre sonhei desde pequena do que, por exemplo, um casamento. (Eu, tá?)

Pois bem, o que o documentário tem de riqueza fundamental é a variedade de depoimentos de diversos profissionais e estudiosos a respeito dos procedimentos-padrão com relação ao parto, como eles são (pra ser bem eufemista) questionáveis, como é necessário um reajuste de valores e vozes. Eu não vou replicar os argumentos expostos no filme, até porque ele precisa ser visto e divulgado (apesar da trilha musical sofrível, pqp).
Mas foi fundamental ver um compêndio de colocações favoráveis a uma via menos regida pela coisificação, pela conveniência e pelo vício de certas práticas que não se sustentasse somente em casos específicos e extremos - cujo conhecimento é igualmente importante, mas que não devem ser tomados como regra, como eu mesma tomei há uns meses atrás diante do meu primeiro contato sério com o assunto.

Basicamente, as sensações que ficam em mim do documentário são:
1) a mulher é esse ser com esse poder, essa potência natural de gerar e parir um outro humano, que privilégio o meu ser uma;

2) o hospital é um grande aliado do parto, se não vier junto com o espaço e os recursos toda a gama de procedimentos abomináveis a que está associado, graças a uma mentalidade regida pela falta de questionamento e de olhar específico sobre cada indivíduo;
3) a cesárea salva vidas, mas é absolutamente desnecessária na vasta maioria dos casos, e é impressionante como o sentimento de proteção e de medo de fazer mal ao próprio filho permite que cesáreas desnecessárias sejam sugestionadas às mulheres. nessas horas, é crucial estar cercada de pessoas com quem uma relação de confiança sólida tenha se estabelecido ao longo da gravidez, pra que no caso de um quadro de risco real a cirurgia não macule a autoconfiança da mulher;
4) mas se a mulher quiser realmente fazer a cesárea e realmente sentir que aquela é a melhor opção pra ela, ela não pode, pelo amor de deus, ser escrotizada pela polícia ideológica alheia;
5) dizer "mas o importante é que nasceu bem, nasceu saudável" minimiza o ato de parir, como se ele fosse secundário, e não é. claro que é importante nascer bem e saudável, mas nem sempre se dimensiona os efeitos psicológicos que certos procedimentos e linguagens causam na mãe E no bebê, ambos num momento tão delicado (porque não quero usar o termo "frágil"), e isso É importante, pra caramba;
6) o medo da dor, das horas, do cocô, sei lá, tudo que está negativamente associado ao parto normal precisa ser desmistificado (ou re-naturalizado), e tenho pensado muito em como há dias difíceis na vida, às vezes anos inteiros, acometidos por dores físicas ou não, mas que a gente gasta tanto tempo e energia pra entender seu sentido e blablablá, e aí você compara com um dia de, digamos, 12 ou 15 horas, em que o seu corpo tá lá, se preparando, e você vai sofrer, vai sangrar, vai talvez cagar na frente dos outros, mas porra, vai sair uma pessoa de dentro de você, que vai viver, sei lá, 80, 100 anos - pra colocar as coisas numa forma bem ingênua e simplista, eu no mínimo acho que a matemática vale a pena.

Enfim, tô com 25 anos. Acho que tá na hora certa pra se pensar nisso, por mais que em algum nível eu sempre tenha pensado. Filho deve rolar pra mim na próxima década. Pras minhas amigas. Eu quero. E quero me sentir confiante de que, até segunda ordem (quiçá terceira), tudo está a nosso favor, que estaremos cercadas de pessoas que vão nos respeitar e nos ajudar, e quero sentir que todas as mulheres têm essas mesmas condições.



Eu não vou aqui desejar um feliz dia das mães porque o que eu desejo é que todas as pessoas, homens e mulheres, pais, mães, filhos, se apossem do seu direito de viver plenamente as suas vidas.

2 comentários:

  1. Ah, Cristine, lucidez é tudo nessa vida! Plenitude também!!! Ainda bem que a gente consegue pensar, refletir, mudar! Beijão, adoro ler cada post aqui!!!

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