Ontem acordei cedinho e fui pra Laranjeiras assistir a uma conferência na Maternidade Escola da UFRJ. Há tempos tenho estado tão envolvida pelas obrigações domésticas, familiares e profissionais que o convite do Dr. Marcus Renato para ouvir a uma palestra me parecia tentador.
Mas a Dra. Maria Esther de A. Vilela, coordenadora da Secretaria de Atenção à Saúde do Ministério da Saúde, acabou proporcionando a toda a assistência uma ocasião muito especial, a chance de aprender e refletir sobre questões da maior importância.
Ela é obstetra e sua atuação no governo está ligada ao programa Rede Cegonha.
Vou transcrever aqui, sinteticamente, algumas das anotações que fiz:
1) Diferentemente das outras especialidades médicas, à obstetrícia cabe assistir e cuidar de um fenômeno natural, o nascimento de bebês, algo que simplesmente acontece sem depender de métodos ou da interferência da Medicina para que se realize.
2) Sobre a notícia da diminuição das taxas de mortalidade infantil no Brasil, ela esclareceu que os índices realmente baixaram, mas relativos à mortalidade de crianças de 1 a 4 anos. Bebês prosseguem morrendo.
3) O que vivemos no Brasil é um processo de "medicalização do nascimento", pois 98% dos partos são realizados em hospitais, e 55,7 % são cesarianas - o que ela denominou como uma "epidemia de cesarianas", expondo mulheres ao risco de problemas que apenas se manifestarão no futuro (como problemas uterinos).
4) Comentou com as pessoas presentes (todas da área da saúde), que nossa cultura abriu flanco para o "modelo tecnocrático do parto" em vigor, que inclui procedimentos como a ocitocina sintética (para apressar as contrações) e uma posição de parto antifisiológica. Fiquei muito impressionada ao saber que aquela posição é a pior posição para uma mulher fazer força! Ela defendeu que é necessário permitir à mulher que assuma a posição que lhe pareça a mais adequada na hora do parto.
5) Falou sobre a imensa importância da presença do pai no parto, se referindo a uma expressão (pelo que entendi) conhecida no meio médico: ao invés de maternidade, deveria se chamar "materpaternidade", pois é um desperdício grave evitar e impedir a criação de vínculo entre pai/filho/mãe nesse momento crucial.
6) Apontou que o modelo de atenção ao parto no país se define no oferecimento de duas opções: o parto traumático e a cesariana, dizendo ser necessário dispormos de uma terceira opção. Porque perdemos a capacidade de nos afetarmos enquanto humanos quando delegamos tudo de nossas vidas a serviços e produtos. Nessa hora, eu fiquei muito impactada com as palavras da Dra. Esther. Ela chamou a atenção para o fato de que a dor do parto é uma potência da mulher, um momento em que ela assume sua força para a realização de um grande feito para o qual a natureza a dotou. Ao final de tudo, ela se premia com o bebê, foi uma força e uma dor necessária para a realização do nascimento. Achei muito bacana essa coisa de a dor ser a manifestação da potência da mulher.
7) Pra terminar, ela falou do contato pele-a-pele. O bebê e a mãe precisam se tocar, ao invés de serem apartados como de costume. Além dos efeitos emocionais e afetivos, ela disse que o bebê precisa ser colonizado pelas bactérias da mãe, e não colonizado pelas bactérias dos profissionais de saúde e do ambiente hospitalar. Assim, ele vem todo puro, virgem, e entra em contato com o mundo.´Dose quando esse contato é com coisas hospitalares.
Enfim, foi uma manhã incrível.
E a gente tão cegamente siderado pelo lado material das coisas da vida...
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